sábado, 12 de abril de 2014

Gregos/Romanos e a música da Igreja Cristã primitiva: Nascimento da Música Ocidental

Embora em muitos aspectos a música da igreja primitiva seja aparentada com a música da tradição grega (homofônica ou heterofônica; sempre associada a um texto poético ou religioso) não podemos dizer que existe um laço de continuidade entre elas. Em sentido estrito, a música do ocidente tem inicio com a Igreja Cristã primitiva e medieval, ou seja, aquele período que compreende dos dois séculos iniciais da era cristã até a tomada de Constantinopla pelos Otomanos (1453).

Ao contrario de outras artes como a literatura, arquitetura e escultura que tanto foram influenciadas pelos modelos dos períodos clássicos da cultura grega e romana, os músicos da Idade Média seque conheciam qualquer exemplo da música da época de apogeu destas culturas. Contudo, os textos filosóficos e teóricos dos gregos foram conservados e suscitaram o interesse dos estudiosos e teóricos medievais. Além disso, muitas das ideias sobre música dos gregos ainda hoje são amplamente discutidas.
É importante lembrar que atualmente – por mais curioso que possa parecer – temos uma idéia muito mais clara de como era a música grega e romana que no passado. Pois graças aos estudos de verdadeiros arqueólogos musicais temos acesso às reproduções de obras sobreviventes destas culturas. Mas apesar do acesso que temos hoje a documentos (filosóficos e teóricos), representações visuais de músicos e seus instrumentos, da música em si nos restam apenas alguns de fragmentos de textos com notação, dos quais a reconstrução ainda causa imensa controvérsia entre os especialistas.
A música para os gregos 

Podemos dividir a compreensão dos gregos acerca da música em dois períodos distintos, no primeiro a música tinha sua origem divina, ligada a divindades como Apolo e Dionísio.

Sendo que o primeiro representava os aspectos sagrados e divinos. Já o segundo aos aspectos sensuais e orgásticos da música. Apolo regia as Musas, que na mitologia grega eram as nove irmãs que presidiam todas as Artes e Ciências (tendo Euterpe como patrona da Música). A música era considerada como um elemento constante na vida e nas suas varias atividades: religiosas, cívicas ou privadas.

Nos períodos mais primitivo da cultura grega (Arcaico, Pré-Homérico e Homérico), a música era vista como detentora de poderes misteriosos capazes de influenciar a personalidade e os costumes, curar enfermidades e até evocar poderes naturais e sobrenaturais. 

Os cultos a Apolo e Dionísio dividiam os usos da música no âmbito religioso, enquanto no culto a Apolo a música era utilizada na consagração dos poderes sobrenaturais do deus solar, como por exemplo, nos Jogos Olímpicos e Pítios. Já no culto a Dionísio, ela prestava-se muitas vezes aos ritos orgásticos das deusas da fertilidade e do amor cultuadas na Grécia e Ásia menor.

Figura 1 Lira instrumento da música de Apolo e o Aulos da música de Dionísio

Nos períodos posteriores (a partir do período Clássico), a música passou a ser vista pelos pensadores gregos como instrumento de descoberta dos segredos cósmicos e também de formação moral do homem. Para muitos filósofos a música era um instrumento da busca da beleza e verdade.

Vejamos alguns exemplos:

Pitágoras e seus seguidores acreditavam que a “chave” para os mistérios do mundo físico e metafísico eram os números e a música. Nesse contexto a música era vista como o instrumento capaz de demonstrar esta afirmativa. 

Claudio Ptolomeu acreditava que os movimentos dos corpos celestes eram regidos por um sistema baseado nos intervalos das escalas musicais, quando este movimento ocorria gerava uma música inaudível ao homem, mas que matinha a harmonia nos movimentos do universo. Mas tarde esta idéia foi eternizada por Platão no mito da “Música Das Esferas”. 

Platão e Aristóteles desenvolveram toda uma doutrina para formação moral e cívica tendo a música e a ginástica como elementos principais, a chamada doutrina do Ethos

Doutrina do Ethos

Como já dissermos anteriormente a maior herança da musical da civilização grega para a Idade Média e o Renascimento foi o pensamento filosófico voltado a Música. Talvez o mais influente sistema filosófico neste sentido tenha sido a doutrina do Ethos.

Na antiga Grécia dentre todas as artes, a música era a mais relevante. Para os gregos a música tinha o poder de influenciar as qualidades da moral do homem e do estado.

A música foi um dos principais interesses da política do estado grego. A formação musical era um requisito básico na educação de qualquer cidadão. A música caberia o papel de formadora da conduta moral, social e política de cada indivíduo dentro estado.

A música dentro da doutrina do Ethos não era um elemento passivo da cultura, os gregos acreditavam (principalmente Aristóteles) que a música é capaz de representar os estados da alma (brandura, raiva, paixão, coragem, alegria, temperança e seus opostos). Acreditava-se que quando escutássemos um trecho musical com uma destas representações, nós seriamos afetados pelo estado representado na melodia, desta forma, depois de certo tempo expostos a estas qualidades elas passariam a fazer parte de nossa personalidade.

Em contrapartida, se fossemos expostos a música que suscitasse sentimentos negativos estes também se tornaria parte de nossa personalidade.

Esse conceito era tão intrínseco na sociedade grega que havia um ditado famoso: “deixai-me fazer as canções de uma nação, que pouco me importa quem faz suas leis”, esta máxima também é um trocadilho, pois em grego a palavra nomos que designa “lei” ou “costume” também era usada para representar esquemas melódicos usados nas canções líricas e para solos instrumentais.

 Estas questões foram tratadas por Platão e Aristóteles, principalmente na República (380 A.C.) e na Política (330 A.C.) respectivamente. Os dois concordavam com o fato de que se a educação musical e física fossem estimuladas de maneira equilibrada, poderiam estruturar o indivíduo e sua conduta moral e emocional de forma suficiente para vida em sociedade. Já o exagero de uma pratica em detrimento da outra poderia ser nociva para a capacidade do individuo viver em sociedade.

Em nossa visão moderna tal preocupação pode parecer exagerada ou autoritária, quase primitiva. Mas é importante lembrar que esta preocupação é evidente em varias sociedades e regimes políticos ao longo dos séculos. No século XX regimes políticos e religiosos têm imensa preocupação com a música vinculada e atualmente vários educadores demonstram preocupação com o tipo de música vinculada à juventude. Infelizmente não chegaram até nós vestígios desta música educativa vinculada aos gregos.


Assim a herança do pensamento grego acerca da música ainda vive entre nós, pois sendo ele é fundamental para vida humana, como a própria música e será sempre retomado e discutindo enquanto somos civilização.

Obras sobreviventes

Atualmente sobrevivem poucos fragmentos da Grécia antiga. A duas mais famosas são Epitáfio de Seikilos datado dos séculos I a.C. e poucos trechos da tragédia Orestes de Eurípides do século V a.C. Apesar de aparentemente simples, a forma pela quais os gregos faziam sua notação musical não é plenamente conhecida, e grande parte da reconstituição destas obras é conjetural.

Figura 2 dois fragmentos de papiro com música notada

O Epitáfio de Seikilos é o mais antigo exemplo de uma composição musical com notação musical e letra no ocidente. A melodia foi encontrada gravada em uma lápide perto de Aidin na Turquia (próximo a Éfeso) datada do século I d.C.. 

Nele é informado a autoria na música, creditada a Seikilos (Ele também poderia ser o mecenas que encomendou a composição). Ao que parece a canção foi composta em homenagem a esposa de Seikilos, provavelmente enterrada no local. Além da composição, foram encontradas estas inscrições:

Eu sou um túmulo, um ícone. Seikilos me pôs aqui como um símbolo eterno da lembrança imortal.

Na figura abaixo uma reprodução do texto gravado na lápide com o alfabeto grego moderno, há uma linha acima com letras e sinais que indicam as notas:

Ilustração 1 texto gravado no Epitáfio de Seikilos

Abaixo temos uma transcrição para notação contemporânea:
Ilustração 2 transcrição


A melodia está escrita num modo dentro de uma oitava que vai de Mi (3) - MI (4), Muito próximo ao modo de Dórico contemporâneo.

A seguir uma transliteração das palavras cantadas na melodia e uma tradução para o português:

Hoson zes, phainou - Enquanto viveres, brilha
Meden holos su lupou - Não sofras nenhum mal
Pros oligon esti to zen - A vida é curta
To telos ho chronos apaitei - E o tempo cobra suas dívidas

Acreditasse que a lápide foi gravada entre 200 a.C. e cerca de 100 d.C. Embora existam exemplos mais antigos de notação musical, todos eles são apenas fragmentos. O Epitáfio de Seikilos é único por ser uma partitura completa de uma composição. Há exemplos ainda mais antigos no oriente de composições notadas. Por exemplo, o Hino para a entrada do Imperador, originário da China é datado para aproximadamente 1000 a.C.

Era cristã

Apesar de sabermos que os primeiros cristãos absolveram muitos aspectos das culturas do Oriente Próximo (judaica e árabe) e do mundo Helênico-Romano, é necessário entender porque não houve uma continuação entre a música da antiguidade ocidental e a música do ocidente cristão.

Quando o Cristianismo se tornou a religião oficial do moribundo Império Romano, as autoridades trataram imediatamente em separar a nova cultura oficial daquela ligada ao passado pagão. Muitos dos aspectos da vida social e privada foram radicalmente alterados, as antigas iconografias dos deuses pagãos foram substituídas por imagens de Cristo; os templos foram convertidos em igrejas; praticamente toda a música e instrumentos utilizados em rituais religiosos pagãos ou desapareceu, foram adaptados ou caíram em desuso.

Mais tarde com a canonização de outras regiões da Europa, como o norte e as ilhas britânicas e a Irlanda, a música primitiva destes povos também desapareceu por completo, por motivos variados, deste o simples desuso e a falta de um sistema de notação para registro, até a proibição destas manifestações musicais imposta por parte das autoridades eclesiásticas.

É necessário se ter em mente que este tipo de proibição não foi uma novidade, deste a antiguidade os povos dominadores tinham como hábito suprimir ou absolver a cultura dominada.

A música na antiguidade (como ainda hoje!) era vista um instrumento determinante para propagação de idéias, desta forma, a ascendente igreja cristã observava sua música com muita atenção. Um notável exemplo é a obra Da Música de Santo Agustinho. Nela o autor, inspirado no pensamento grego de Platão e Aristóteles trata de conceitos de como devem ser as melodias e seus aspectos éticos e vocacionais.    


Muito do desenvolvimento da linguagem musical do ocidente esta ligada a música litúrgica, por dois motivos básicos: ela foi extensamente divulgada na Europa pré-medieval e desta maneira suas formas e linguagem melódicas tornaram-se modelos para música secular. Assim, muito da música que hoje é rotulada como música "ancestral" ou "pagã" europeia tem suas raízes no período medieval com forte influência da música cristã da antiguidade.

O Cantochão

Cantochão “inaugura” a música do ocidente, apesar de sua teoria ser pautada sobre os manuscritos da época clássica da civilização greco-romana, ou até mesmo fontes anteriores (salmos do Antigo Testamento). Em termos práticos o cantochão pouca relação musical com a música destas culturas.
O cantochão é a música mais antiga ainda em uso, ela representa um dos grandes e mais ricos tesouros da cultura ocidental.

Na prática o cantochão é:

Monofônica e originalmente desacompanhado. Muitas vezes temos referencias a coros, que na verdade cantam as melodias e uníssono ou em oitava (quando há jovem entre os coristas).

As melodias normalmente são era cantadas por graus conjuntos, ou seja, quase sem saltos, dentro de um âmbito não ultrapassa uma oitava e o ritmo é baseado na acentuação tônica da língua latina.

Um aspecto curioso do Cantochão primitivo é que as melodias eram todas anônimas, não se costumava identificar seus autores, algo que só passou a acontecer por volta do séc. VII e VIII.

Isso se deve a máxima teológica afirma que se todos são iguais aos olhos do criador, desta forma suas obras também o eram. Dessa forma, não havia motivo para destacar um autor, por outro lado, em termos práticos os cantos eram todos pertencentes a igreja e seu serviço.

O cantochão pode ser dividido quanto ao texto, forma e estilo.

Quanto ao texto

Textos bíblicos
Textos em prosa (as lições do Ofício Divino, as epístolas e o Evangelho da missa).
Textos poéticos (os Salmos e os Cânticos).
Textos não bíblicos
Textos em prosa (o Te Deum e várias antífonas incluindo as Marianas)
Textos poéticos (os hinos e as sequências de cultos e Missas)

O Cantochão pode também ser classificado em sua forma (como cantado):

Quanto a Forma

Antífono: dois coros cantam versos com um refrão, alternadamente;
Responsório: solistas cantam os versos e o coro canta o refrão;
Direto: os cantores cantam os versos e não há refrão.

Quanto ao Estilo

Refere-se à relação entre as notas entoadas (melodia) e as sílabas pronunciadas (texto):

Silábico: os cantos em que a cada sílaba do texto corresponde a uma nota somente.
Melismático: os cantos em que uma única sílaba de uma palavra canta longas passagens de notas.

Neumático: o canto é na maior parte dele silábico e, em poucas breves passagens, segue um melisma de quatro ou cinco notas somente sobre algumas sílabas do texto.


Os primeiros hinos cristãos surgem nas Igrejas de Jerusalém, Antioquia (na Síria) e da Ásia Menor chegando a Europa via Bizâncio e finalmente Milão. O historiador Romano Plínio, O Jovem, documentou estes hinos por volta do ano 112 d.C.

Um dos principais núcleos do desenvolvimento dos cantos da igreja primitiva foi Bizâncio (ou Constantinopla, atual Istambul) como centro urbano e político após a queda de Roma.

Bizâncio passou a incorporar o papel de núcleo não só da política, mas também da religião do ocidente. Lá ocorre uma grande evolução dos hinos primitivos relatados por Plínio para formas mais elaboradas, sendo a mais importante delas o kontakion.


Contudo apesar da centralização de Bizâncio várias regiões da Europa desenvolveram suas próprias formas de liturgia, conseqüentemente, criando variações dos hinos do cantochão. Com o tempo cada território do antigo império romano formalizou seus ritos e cantos ritos no norte da Itália e o canto Ambrosiano, já no sul o Benaventino; na região da Gália (França) o canto Gálico; Na Espanha o Moçárabe; e na Inglaterra o Sarum.

Por volta de 590, o papa São Gregório Magno visando o fortalecimento da Igreja Romana inicia um movimento de unificação dos Ritos cristãos, este movimento é marcado pela abolição dos ritos regionais (e com eles seus cantos característicos) sendo seguindo da instauração de um modelo padrão de liturgia e canto. Este movimento foi mais tarde chamando de Reforma Gregoriana. Esta reforma é levada a cabo pelo Papa Gregório Magno e por seu sucessor o papa Vitaliano.

Contudo, somente no período carolíngio ela é finalmente concluída. Graças ao imperador Carlos Magno que por volta de 789, impõem o uso da liturgia romana dentro do território do reino Franco. E quando coroado imperador do Sacro-Império Romano institui o Rito e o Canto Gregoriano como o rito oficial de toda a Europa cristã.


Entretanto ainda hoje é possível ouvir o Canto Ambrosiano é cantado atualmente nos arredores de Milão e o canto Moçárabe em Toledo e Salamanca. 

O Oficio e a Missa

A principal aplicação da música sacra no final da Antiguidade e inicio da Idade Media ocidental foi nos oficio e missas. Dentro destas formas temos as primeiras manifestações formalizadas da música ocidental que temos noticia.  

O Oficio ou as Horas Canônicas são a rotina religiosa dos mosteiros, sua primeira codificação ocorreu por volta de 520 dentro da Regra de São Bento. O oficio é celebrado todos os dias em determinadas horas tanto nos mosteiros quando em determinadas igrejas e catedrais. As Horas canônicas se dividem em:

Matinas: antes do nascer do sol
Laudas: ao amanhecer
Prima, terça, sextas e novas: às 6h, 9h, 12h e 15h respectivamente. 
Vésperas: ao pôr do sol
Completas: logo a seguir das vésperas

O oficio é composto por orações, salmos, cânticos, antífonas, responsórios, hinos e leituras. 

A música dos ofícios esta compilada nos Antifonários. Os principais momentos musicais dos ofícios estão nos Salmos e suas respectivas antífonas, no canto dos hinos e cânticos, além da recitação das passagens das Escrituras. Alguns cânticos eram comuns em alguns casos: como nas Vésperas o canto do Magnificat anima mea Domino (A minha alma glorifica o Senhor). E nas Completas as quatro antífonas da Virgem Maria (Antífonas Marianas), cada uma nos seus respectivos momentos do calendário litúrgico:

Alma Redemptoris Mater (Doce Mãe do Redentor) desde o advento a 1 de fevereiro
Ave, Regina caelorum (Salve, Rainha dos Céus) 2 de fevereiro à quarta-feira da Semana Santa
Regina coeli laetari (Alegrai-vos, Rainha dos Céus) da Páscoa até o domingo da Trindade
Salve, Regina (Salve, Rainha) Da Trindade até ao advento

A execução correta destes cânticos era tão importante quando a liturgia em si. Para que sempre se seguisse em boa ordem os ritos da liturgia da Regra de São Bento temos nela indicado o surgimento da figura do Chantre incumbido de organizar o scripitorum e o serviço religioso, assim como a música. Por volta do século VI surgem as Schola Cantorum que eram grupos destinados à formação de cantores para desempenhar o canto dentro do serviço religioso.

A Missa

Como sendo a missa o serviço religioso mais importante, o papel de sua música passou a ser de extrema relevância dentro do mundo cristão. Até por volta do Século VII não havia um padrão comum para sua celebração, até o edital Ordo romanus primus (final do século VII) que era um conjunto de instruções para celebração litúrgica. Nele foram determinados textos das missas variavam de acordo com a data, já outros passaram a ser fixos dentro do serviço. 

Estas duas categorias são chamadas de:

Próprios: eram os textos que variavam: orações (colectas) e Epistolas. As partes musicais: Intróito; Gradual, Aleluia, Tractus, Ofertório e Comunhão (Communio).

Ordinário: as partes invariáveis do serviço: Kyrie, Gloria, Credo, Sanctus, Benedictus, Agnus Dei e Ite, missa est.

As partes da missa eram assim organizadas pelo Ordo romanus primus:

Intróito que é normalmente um salmo cantando na entrada do padre. Segue o Kyrie, que é composto de dois refrões onde o primeiro é repetido após o canto do segundo: kyrie eleison (Senhor, tende piedade de nós); Christo eleison (Cristo, tende piedade de nós). Cada um é cantando três vezes, sobre uma mesma melodia. 

Depois o Gloria: iniciado pelo padre e continuado pelo coro a partir do trecho “Et in terra pax”. Depois temos a colecta e a leitura da epístola do dia e logo em seguida o canto do Gradual e da Aleluia (na Páscoa a Aleluia é substituída pelo Tracto). 

Segue a leitura do evangelho e depois o canto do Credo iniciado pelo padre e continuado pelo coro a partir do trecho “patrem omnipotentem”, segue o sermão e a eucaristia. 

Durante a partilha do pão cantasse o Ofertório, seguisse uma nova colecta e o canto do Sanctus e o Benedictus, depois o canôn (prece da consagração) e a oração Pater Noster, depois o canto do Agnus Dei; após o consumo do pão e vinho temos Communio e o Post-Comunio e a missa é concluída com a formula: Ite, missa est ou com Benedicamus Domino.

Desenvolvimentos ulteriores ao Ordo romanus primus

Entre os séculos V e IX os povos do centro e norte da Europa já se encontravam convertidos, o canto gregoriano já era uma instituição firme. Por volta de 719, com a invasão muçulmana na Síria, norte da África e península da Espanha, fez com que a cristandade se deslocasse mais para norte e assim surgissem outros centros políticos e de irradiação cultural. 

Assim tornando a França o centro da cristandade. Esta proximidade do centro da cristandade, fez com que em outras regiões da Europa, missionários começassem a fundar escolas e congregações, em região até então distantes de Roma como na Irlanda, Escócia, Alemanha e Suíça surgiram centros de música importantes, como o mosteiro de São galo na Suíça. Neste período os compositores começaram a sair do anonimato passaram a ser identificados nos registros e Codex.

Com estas novas escolas surgiram também novas formas de ser fazer a música, por exemplo, as melodias do cantochão no norte da Europa como Christus hunc diem são cantadas com vários saltos melódicos. 

Estes compositores não só desenvolveram uma nova maneira de canto, mas também novas formas musicais, sendo as três principais o Troppo e Sequentia, Drama Litúrgico. Estas formas de composição são importantes, pois pela primeira vez em vários séculos os músicos da igreja que apenas adicionavam textos a melodias prontas, passaram a compor tanto a música e o texto ao mesmo tempo.

O Troppo surgiu por volta dos séculos X e XI, e era na verdade um adendo em estilo neumático e com textos poéticos dos cantos antífonos do próprio da missa. Mais tarde surgiram como adição das partes do ordinário da missa, especialmente para o Gloria. Um nome que se destaca neste tipo de composição é o do monge Tuotilo do mosteiro de São Galo.

Já nos primeiros manuscritos do cantochão podiam-se observar longos trechos melódicos melismáticos, que muitas vezes se repetiam sem qualquer modificação em diferentes coletâneas. Estas longas melodias na música do serviço ficaram associadas às Aleluias

A estas melodias se deu o nome de Sequentia (do latim sequor ou seguir). É creditado ao monge de São Galo, Notker Balbulus “O Gago” (840-912) a autoria das primeiras Sequentia, ele escreveu sobre os melismas palavras. A Sequentia no serviço religioso passou a ser cantada entre os salmos e partes do ordinário das missas.

Quanto a sua forma a Sequentia se dividia normalmente em quatro grupos melódicos A B C D que eram repetidos até o fim do texto e uma formula conclusiva N. A melodia A era sempre uma formula inicial e B um trecho diferente melodicamente de A. Já C e D guardam semelhanças melódicas, contudo D é semi-conclusiva. A parte final N é uma formula melódica de conclusão, normalmente sobre as palavras “Amém”.   

A Sequentia com o tempo se torna independente do texto sacro e seu modelo é usado em canções populares e músicas instrumentais para dança. O Concilio de Trento (1543-1563) bane a forma do serviço religioso, mantendo apenas cinco Sequentia: Victimae paschali laudes usada na Páscoa; Veni Creator Spiritus no domingo de Pentecostes; Lauda Sion no Corpus Cristis; Dies Irae e Stabat Mater.

O Drama Litúrgico consistia em pequenos diálogos cantados apresentando trechos e de passagem dos evangelhos ou referentes a eles e que estivem de acordo com o calendário canônico. Muitos destes textos eram originais em termos de texto e música. Eles eram apresentados antes do Intróito. O mais conhecido entre eles é Quem quaeritis in praesepe.   
  
Mais tarde o drama litúrgico se tornou uma forma independente e mais extensa, como por exemplo, Ordo Virtutum (1152) de Hidengard Von Bingen (1098-1179). O formato do Drama Liturgico foi copiado pelos músicos populares para apresentação de temas seculares.

Neumas: sistema de notação do Cantochão

Neuma (do grego νεύμα Neum, sinal, ou alteração de pneuma grego πνεύμα, respiração) foi o sistema de sinais de notação musical utilizados desde o Séc. IV e em toda a Idade Média até a criação do sistema moderno de cinco linhas. O neuma é uma fórmula melódica e rítmica aplicada a uma sílaba (uma única sílaba pode receber várias neumas nos vocais melismaticos). 

Diferentemente da abordagem moderna, o elemento básico da notação do canto gregoriano (quer para a sua análise ou a sua interpretação) não é a nota musical, mas neuma

Os neumas descrevem pequenas fórmulas melódicas aplicadas à uma sílaba, cada tipo de neuma correspondente a um valor acima da melódica e rítmico em particular. O monge-teórico (e compositor) Hucbald Saint-Amand (v.850-930) faz alusão, em sua Musica (v. 885) eo caráter rítmico de neumas ornamentais gravado sem linhas (em Campo aperto) no seu tempo .


Inicialmente, somente o texto litúrgico é anotado na gradual. Mas as melodias são transmitidas apenas oralmente.

No Séc. IV aparece o neuma .é um conjunto de sinais, escritos geralmente acima do texto, que permitiam ao cantor  "encontrar" a canção que ele conhecia de memoria, mas sem indícios claros de intervalos ou altura notas. Os primeiros registros por neuma surgem por volta do ano 850. A classificação baseia-se fundamentalmente em acentuada o uso de dois tons simples:
  • O acento grave \ de cima para baixo, indica que a sílaba é pronunciado em um mais grave do que o resto.
  • O ascendente aguda / indicando vez que a sílaba é pronunciado em um tom mais acentuado do que o resto.
 O acento agudo cai na sílaba tônica, o acento grave sobre as interpolações e terminações das palavras. Na declamação de textos litúrgicos, de acordo com a pronúncia do latim usado na Idade Média, as sílabas são cantandas em um tom neutro, sem acentuações fortes.  Ao acento agudo foi dada a virga, já ao acento grave para simplificar uma pequena linha (tractulus) ou um simples ponto (punctum).

Estes sinais podem ser combinados para grupos nota melódica em uma única sílaba:
  • /\ ( clivis ) agudos e graves (acento circunflexo) traduz a sucessão de duas notas, a primeira maior que o segundo.
  • \/ (Podatus) e Aguda Severa (anti-acento circunflexo) é a sucessão de duas notas, a primeira mais grave do que o segundo.
  • /\/ ( porrectus ) um grupo de três notas em sucessão agudo, grave e agudo.
  • \/\ (Torculus) três notas em sucessão aguda grave e grave. Ut Queant laxis





Origem notas da escala: Hino de São João Batista, Guido d'Arezzo, que foi usado para nomear as notas da escala.

 Seguindo o mesmo princípio, os grupos mais complexo de quatro ou cinco módulos podem ser construídos: / \ / \ flexus porrectus, \ \ / resupinus Torculus, etc. 

Na notação silábica, as notas são descritos como "grave" ou "grave" a partir da linha melódica das sílabas outros. Em contraste, na notação de sílabas modulada, as variações de altura são detectados pelo resto do grupo, independentemente da altura desse grupo em relação ao resto da frase.

Esta avaliação foi bem consciente do ritmo, e dá orientações sobre o áspero linha melódica (para cima ou para baixo), mas não em altura e periodicidade de cantar.

A notação neuma quadrado
Dans la notation grégorienne, les notes se présentent en groupes appelés neumes .Na notação gregoriana, as notas são apresentadas em grupos chamados neumas. Tous les neumes sont toujours interprétés de manière liée, le groupement graphique reflétant leur nature de groupe de note.Un neume (ou un groupe d'éléments neumatiques) s'applique toujours à une syllabe unique. Um neuma só pode ser aplicado a uma única sílaba. En revanche, une syllabe peut recevoir un neume formé de plusieurs notes, voire de très nombreux neumes (de tels groupements s'appellent des mélismes). Em contraste, uma sílaba pode receber grupos de neumas (Esses grupos são chamados melisma).
Dans tous les neumes, la hauteur de la note à émettre est marquée sur la portée par un élément graphique.Em todos os neuma, a altura da notas está marcada no âmbito de um elemento gráfico. Une note peut être marquée par quatre signes graphiques: A nota pode ser marcado por quatro sinais gráficos:




* Par un petit carré (le plus fréquent). * Para um pequeno quadrado (mais comum).
* Par un losange (qui s'appelle également punctum , mais ne se trouve jamais isolé). * Para um diamante (também chamado punctum, mas nunca é isolado).
* Par une sorte de carré barbelé dénotant un quilisma . * Por uma espécie de praça que denota uma Quilisma farpado.
* Par le bec supérieur de la hampe qui intervient dans la composition graphique du porrectus . * Para o bico superior do pólo, que ocorre no porrectus gráfico composição.
Les traits verticaux qui unissent les différentes parties du neume ne servent qu'à guider l'œil et marquer l'unité du neume. As linhas verticais que ligam as diferentes partes do neuma só servem para orientar o olho e marca a unidade do Neuma.

A notação Neumatica é o mais antigo sistema de registro  musical de uma melodia ainda em uso, ele foi o ponto de partida para notação moderna e ajudou a afirmar o conceito de obra musical.


História da música ocidental - Donald Jay Grout, Claude V. Palisca
Uma Breve História da Música - Roy Bennett
Masterpeices of music before 1750 - Carl Parrish
Music: The Definitive Visual History - Ian Blenkinsop
A Concise History of Western Music - Paul Griffiths
Harvard Dictionary of Music - Willi Apel

PS: Foda-se abnt

3 comentários:

Carlo Celuque disse...

Olá Marcelo. Gostei muito da sua síntese acima. Qual foi a sua fonte? Grout, Candé? Obrigado

Carlo Celuque disse...

Olá Marcelo. Gostei muito da sua síntese acima. Qual foi a sua fonte? Grout, Candé? Obrigado

Marcello Ferreira Soares Jr disse...

Oi Carlos,

Cara minha principal referência é o Grout & Palisca entre outros livros. Muitas informações também foram extraídas dos encartes de vários álbuns de música antiga.

Música Barroca instrumental.

Vou nesse texto falar de forma genérica de aspectos da música instrumental do Período Barroco sem me deter a especificidades ou ao rigor de ...